Boletim 3: Honduras
Choluteca, 28 de Fevereiro de 2007
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Caríssimos,
Estou firme aqui, até agora nenhuma coléra, diarréia nem nada, haha, e olha que cruzo cada gringo no caminho que já entrou no soro por aqui. Bem, seguimos com a descrição da arte mambembe de percorrer estas terras remotas centro-americanas:
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Estou em Choluteca, uma cidade terrivelmente quente, num cyber abafado, molhando o teclado com algumas gotas de suor que pingam do meu rosto. Hoje é meu último dia em Honduras, e será com pesar que deixo o país, queinicialmente julguei ser o menos interessante dentre os quais viajaria. Grande injustiça!
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Cruzando a fronteira entre Guatemala e Honduras
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Uma geralzinha sobre o país:
O nome do país significa algo equivalente a "profundezas", conforme batismo de Cristóvão Colombo, devido às águas fundas da região do desembarque em 1502. A resistência indígena contra os invasores espanhóis foi forte. Lempira, o líder da tribo Lenca, comandou os combates e chegou a mandar muito espanhol de volta pra casa. Anos mais tarde, ele foi assassinado numa emboscada onde seria feita uma conversa pacífica entre ele e os espanhóis.
Aliás, esse golpe foi parecido ao que Pizarro aplicou na captura do líder inca Atahualpa, em Cajamarca, no Perú. Porém, Lempira segue ainda hoje como herói nacional e seu nome também designa a moeda de Honduras.
Atualmente, 90% dos hondurenhos são mestiços e o restante se divide entre indígenas autóctones, brancos e garífunas (garífunas: vide boletim anterior). Após a independência, o país começou a sofrer forte influência dos EUA, que instalaram empresas para explorar a produção de frutas. A partir daí, os americanos passaram a controlar politicamente a região, conforme os interesses de suas empresas. Houve revoltas populares que eram sempre abafadas pelos EUA, que apoiavam os regimes ditatoriais, sempre coniventes aos seus interesses. Durante os anos 80, o país foi forçado a servir comobase para o exército americano na guerra dos Contra, quando os EUA combatiam o regime sandinista da vizinha Nicarágua. A influência americana acabou somente ao final da guerra, quando os EUA se retiraram do país. Atualmente, Honduras encontra-se sob influência brasileira, devido à minha presença.
O nome do país significa algo equivalente a "profundezas", conforme batismo de Cristóvão Colombo, devido às águas fundas da região do desembarque em 1502. A resistência indígena contra os invasores espanhóis foi forte. Lempira, o líder da tribo Lenca, comandou os combates e chegou a mandar muito espanhol de volta pra casa. Anos mais tarde, ele foi assassinado numa emboscada onde seria feita uma conversa pacífica entre ele e os espanhóis.
Aliás, esse golpe foi parecido ao que Pizarro aplicou na captura do líder inca Atahualpa, em Cajamarca, no Perú. Porém, Lempira segue ainda hoje como herói nacional e seu nome também designa a moeda de Honduras.
Atualmente, 90% dos hondurenhos são mestiços e o restante se divide entre indígenas autóctones, brancos e garífunas (garífunas: vide boletim anterior). Após a independência, o país começou a sofrer forte influência dos EUA, que instalaram empresas para explorar a produção de frutas. A partir daí, os americanos passaram a controlar politicamente a região, conforme os interesses de suas empresas. Houve revoltas populares que eram sempre abafadas pelos EUA, que apoiavam os regimes ditatoriais, sempre coniventes aos seus interesses. Durante os anos 80, o país foi forçado a servir comobase para o exército americano na guerra dos Contra, quando os EUA combatiam o regime sandinista da vizinha Nicarágua. A influência americana acabou somente ao final da guerra, quando os EUA se retiraram do país. Atualmente, Honduras encontra-se sob influência brasileira, devido à minha presença.
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Copán
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Vista de Copán
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Cheguei no país vindo da Guatemala, cruzando a fronteira terrestre sem maiores problemas. A primeira cidade que conheci foi Copán, um pequeno vilarejo pacato, que fica próximo ao sítio arqueológico de Copán Ruínas, e que serve como base para visitá-lo. Na chegada fui trocar dólares por lempiras e, como o câmbio é bem desvalorizado, eu recebi tantas notas em troca que minha carteira não fechava. A carteira ficou na horizontal, não dobrava! daí tive que dividir a "fortuna" entre dois bolsos. Eu estava me sentindo o ganhador da mega-sena e quase pedi escolta pra sair do banco (detalhe: eu só troquei 50 dólares!). Então fui almoçar, cheguei num restaurantezinho que parecia o da dona Florinda, com aquele balcão que você levanta uma parte pra passar, sabem? Só faltava chegar o Jaiminho de bicicleta pra almoçar comigo. No dia seguinte fui pra Copán Ruínas. Este é um sítio arqueológico muito antigo, que data de 1.200 antes de Cristo, aproximadamente. Também é um sítio Maya, mas bem diferente de Tikal (vide boletim 2), pois ao invés de pirâmides gigantes, o forte é a escultura em pedra, com totens gigantes desenhados perfeitamente nas rochas. O interessante é que todo este complexo está interligado por túneis, e dá pra entrar neles. A perfeição da engenharia Maya é impressionante, todas as ligações subterrâneas permanecem e os túneis tem até sistema de ventilação e esgoto.
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Estela Maya - Copán Ruínas
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Pirâmide - Copán Ruínas
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Voltei pra Copán no final da tarde e na praça do vilarejo estava rolando uma festinha popular com um quarteto estilo mexicano. Eu colei nos mariachis porque já não aguento mais viajar sem música. Daí os caras viraram meu ipod, comecei a discotecar o grupo, pedindo músicas e todo mundo dando aqueles gritinhos típicos no meio das músicas: ÚI, ÚI !!! Depois de atender a 4 pedidos meus, o meu juke box mexicano queria passar a cobrar por cada escolha minha do cancioneiro mexicano, separei os quilos de moeda que vieram do banco e foi indo, cada fichinha no bolso era uma música, daí vai: ÚI, ÚI... Deu vontade de colocar os quatro mariachis na mochila pra não mais faltar música na viagem.
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Detalhe da Estela
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Depois de Copán, a maioria dos mochileiros desce pras Bay Islands, que são ilhas turísticas paradisíacas na costa de Honduras, para ficarem lá jogados por uma semana. Como eu não estou atrás deste sossego todo, não me dei ao luxo de tal privilégio e decidi fazer uma rota pelas montanhas, pra conhecer lugares mais intactos do país. Fui então pra outra cidade chamada Santa Rosa de Copán (tudo nesta província tem Copán no nome), sem dúvida a cidade com os habitantes mais simpáticos de toda América Central. É normal que em cidades pequenas as pessoas sejam mais próximas, se cumprimentem e conversem mais, isso a gente já sabe. Porém, em Sta. Rosa estava demais. Simplesmente todo mundo que cruzava meu caminho me cumprimentava com vontade, como se eu fosse alguém conhecido, até fiquei meio desconfiado com tanta simpatia. Parecia que a cidade tinha combinado: olha, vai chegar um carinha do Brasil aí, vamos tratá-lo como um filho.
Os caras são tão gente fina que uma hora eu estava tirando uma foto da igrejinha na praça central, veio um cara e disse: Não!!!!, não tira foto deste ângulo, vá até o outro lado da praça que a foto vai sair bem melhor, sem esses fios de eletricidade na frente. Tá bom! eu fui, e realmente a tomada foi bem melhor, sem fios, tomada wireless!
Os caras são tão gente fina que uma hora eu estava tirando uma foto da igrejinha na praça central, veio um cara e disse: Não!!!!, não tira foto deste ângulo, vá até o outro lado da praça que a foto vai sair bem melhor, sem esses fios de eletricidade na frente. Tá bom! eu fui, e realmente a tomada foi bem melhor, sem fios, tomada wireless!
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Ônibus que me levou até Sta. Rosa de Copán (esq.) e Sta. Rosa de Copán (dir.)
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Até aí tudo bem, mas depois veio um tiozinho na calçada com um chapelão de palha na cabeça, parou e fez questão de apertar minha mão e ficou falando pra onde ele ia, daonde ele estava vindo, sem eu perguntar nada! o bicho estava doidão e nessas alturas a minha presença na cidade já repercutia, experimentei a fama por um dia aqui em Honduras, e não adiantava sair de óculos escuros pra não ser reconhecido.
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Igreja de Sta. Rosa de Copán
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Nativos vendo a tarde passar
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Depois fui pra Gracias, outra vilarejo de montanha. A estrada entre Sta. Rosa e Cracias corta as montanhas centrais de Honduras e haja freio pro ônibus escolar. Aliás, já estou todo retorcido de tanto andar nestes ônibus. Chegando em Gracias fui almoçar e a mulher que servia a mesa foi até a televisão trocar de canal e parou no Chaves! Almoçando nos cafundós de Honduras, assistindo Chaves foi algo impagável, e ainda na versão original em espanhol foi uma dádiva. Comecei a soltar umas risadas e o pessoal das outras mesas também estava se rachando. Chaves é um ícone cultural, tinha que ser declarado patrimônio da humanidade pela Unesco.
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Vista da cidade de Gracias
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Gracias tem um clima meio faroeste, ruas empoeiradas, meio terra de ninguém. Nego anda de chapelão branco na cabeça e com facão na cintura, porque trabalham no campo. O problema é que chega o fim da tarde, nego encosta no boteco e depois de entornar todas sai na rua bebaço girando o facão pensando que é He-Man, aí tem que mudar de calçada pra evitar o acidente. No hotelzinho que fiquei, o quarto dava pra rua, muito estranho. Eu entrei na recepção e quando pedi pra ver o quarto a mulher me levou pra fora do hotel, abriu uma porta na rua e disse: acá está mi amor, tu habitación.
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Gracias
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Falando em hotel, a América Central é muito estranha. Em alguns lugares (poucos) cheguei a ficar em albergues estilo internacional, limpos, com chuveiro quente e mochileiros de várias partes do mundo. Já em outros lugares (quase todos os outros) o esquema é o básico do básico. Você primeiro tem que perguntar se tem água, depois pergunta se tem água quente, mas quase nunca tem aquecimento. O problema foi nas cidades altas, onde faz frio de noite. Agora que já desci e estou neste forno, a sorte é quando tem água fria mesmo. Bom, fora uma baratinha aqui, uma aranhazinha ali que tem que matar antes de dormir, tem que fazer aquela inspeção básica antes de dormir. Depois a idéia era ir pra Tegucigalpa (capital) e ficar só um dia pra poder trocar de ônibus pra ir pra Nicarágua. No entanto, é difícil ter ônibus direto pra maioria dos lugares, então, comecei cedo. Cinco da manhã saí de Gracias e fui até La Esperanza para trocar de ônibus. Cheguei em Tegucigalpa e acabei ficando 15 minutos na cidade, de tão caótica que é, decidi já me enfiar num terceiro ônibus pra Choluteca, já perto da fronteira com a Nicarágua, cheguei às 5 da tarde. Neste último ônibus de Tegucigalpa a Choluteca, mais um motorista hilário. Em quase todos os ônibus rola música, o azar é que sempre é o brega do brega. Imaginem o que é viajar horas ao som de um Amado Batista hondurenho, sempre com músicas cornudas, ou então com o regueton explodindo na sua cabeça. Até já decorei alguns sucessos, por causa da repetição. Bom, mas neste ônibus estava rolando o mais puro regueton e o motorista tinha um retrovisor interno gigante no qual ele podia ver os passageiros e nós também o víamos. Então ele colocava os óculos escuros na testa, comandava o som e dava umas olhadinhas no retrovisor pras duas hodurenhas que estavam sentadas logo atrás dele e fazia umas caretas ousadas pra elas, muito maroto o nosso condutor. Ele dava umas dançadinhas, só na ginga com o ombro e nas risadinhas pras muchachas. O perfeito latin lover. Sem contar as inúmeras paradas onde entra gente pra vender de tudo. As vezes entram uns caras vendendo remédio caseiro, e ficam fazendo um discurso enorme pra contar os milagres das tais pastilhas. Haja.....
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Mulher tecendo
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Bom, posso dizer que Honduras me surpreendeu, principalmente pelo seu povo e pelos lugares que passei, lugares ainda distantes do que é o mundo atual. Amanha mais uma fronteira, que venha a Nicarágua!
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Saudações a todos!
Márcio.-
Um comentário:
Continuo com a sensação de quem lê o romance Viagem a Portugal de Saramago. Cadê os mapas? (desculpa pelo vício de geógrafa). Honduras parece ser mesmo especial... Há muitos romances, contos, poesias de escritores latinos aqui no Brasil que dá para saber um pouco mais sobre esse mosaico chamado América Latina. Aliás, são estes que registram a história e geografia dos vencidos. Como diz Sevcenko: A literatura como missão! Ato de registrar a memória dos vencidos, dos marginalizados, dos desvalidos.
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